Por Gisella Leitão
Sabemos que as microempresas e as pequenas empresas são fundamentais para preservar empregos formais, impulsionar a economia através da circulação de riquezas e contribuir com impostos para o Estado. Portanto, é crucial reconhecer seu papel vital na estrutura econômica do país.
Nesse sentido, há um microssistema protetivo aos interesses das microempresas e das empresas de pequeno porte nas aquisições públicas previsto nos art. 42 ao art. 49 da Lei Complementar n. 123/2006. A legislação estabelece os seguintes benefícios para que esses agentes econômicos possam participar de licitações públicas em condições de concorrer com os empresários de médio e de grande porte:
i) a possibilidade de submeter ao órgão público responsável pela condução do certame a comprovação da sua regularidade fiscal e trabalhista de forma postergada em relação ao que se dá com os demais concorrentes que não possuam o enquadramento de microempresa ou de empresa de pequeno porte.
ii) o empate ficto, que corresponde a situação em que, uma vez submetidas as propostas pelos interessados em contratar com a Administração Pública, caso a oferta feita pela microempresa ou pela empresa de pequeno porte melhor classificada esteja dentro de um limite acima daquela que seria a vencedora e que não foi apresentada por uma sociedade que se ajuste à Lei Complementar n. 123/2006, deve o responsável por conduzir a licitação franquear a possibilidade de que aquela faça uma nova proposta capaz de superar a momentaneamente melhor classificada.
iii) a emissão de Cédula de Crédito Microempresarial quando detiverem créditos decorrentes de empenhos liquidados pela Administração Pública não pagos em até 30 dias contados da data da liquidação.
iv) a realização pelo poder público de licitações exclusivas para microempresas e empresas de pequeno porte quando o objeto a ser contratado tiver a expressão econômica de até R$ 80.000,00.
v) a obrigatoriedade de que o licitante vencedor subcontrate uma microempresa ou uma empresa de pequeno porte.
vi) a cota de reserva de 25% nos certames que tenham como objeto a aquisição de bens de natureza divisível.
Restrições geográficas em licitações com microempresas têm sido objeto de debate em contextos jurídicos e econômicos. Essas restrições se referem à prática de limitar a participação de microempresas e empresas de pequeno porte em processos licitatórios com base em sua localização geográfica.
Alguns argumentam a favor das restrições geográficas, defendendo que elas podem ser uma maneira de promover o desenvolvimento econômico local, protegendo empresas regionais e estimulando a economia em áreas específicas. Essa visão sugere que ao favorecer empresas locais, a economia regional é fortalecida, criando empregos e aumentando a receita tributária.
Nesse diapasão, o Tribunal de Contas do Estado do Paraná publicou o Prejulgado n. 27 em que reconhece como admissível o emprego de licitações públicas para a participação exclusiva de microempresas e empresas de pequeno porte locais ou regionais, a depender da sua sede. Segundo a Corte de Contas Paranaense seria possível a restrição desde que: i) a Administração Pública estabelecesse um plano estratégico voltado a viabilizar a circulação de riquezas com maior intensidade em uma dada localidade para que naquela região fossem fomentadas as microempresas e as empresas de pequeno porte; ii) a restrição fosse suficientemente justificada; e, iii) a cláusula editalícia que impõe a restrição geográfica tenha sido autorizada por lei local ou regional decorrente do planejamento estratégico estabelecido de forma justificada pelo poder público.
Por outro lado, críticos das restrições geográficas argumentam que elas podem prejudicar a competitividade e a eficiência dos processos licitatórios. Limitar a participação a empresas locais pode reduzir a diversidade de ofertas e, potencialmente, resultar em preços mais altos para o setor público. Além disso, pode criar barreiras desnecessárias para empresas de outras regiões que poderiam oferecer serviços ou produtos de qualidade similar ou superior.
Portanto, o debate sobre restrições geográficas em licitações com microempresas envolve considerações sobre o equilíbrio entre promover o desenvolvimento local e garantir a eficiência e a transparência nos processos de contratação pública. É importante encontrar um ponto de equilíbrio que leve em conta tanto os interesses das empresas locais quanto a necessidade de garantir uma concorrência justa e aberta.
Importante lembrar que a Reclamação n. 59.618/SE, julgada recentemente pelo Supremo Tribunal Federal, que enfrentou a decisão do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe que invalidou alguns dispositivos da lei estadual que estabelecia as restrições geográficas para a participação em determinadas licitações públicas, sob o argumento de que traria um regramento mais benéfico aos agentes econômicos de menor porte situados nos municípios daquele estado. Contudo, a dita reclamação não deve ser considerada como um precedente a respeito do tema, na medida em que ela não se debruça sobre essa questão, mas ficou adstrita a uma questão processual.
Conclui-se que, em vez de impor restrições geográficas, é mais adequado promover reformas no quadro normativo para facilitar e reduzir os custos operacionais das microempresas e empresas de pequeno porte, mantendo a competitividade e a busca pela melhor proposta nas licitações públicas.
Portanto, o debate sobre restrições geográficas em licitações com microempresas envolve considerações sobre o balanceamento entre promover o desenvolvimento local e garantir a eficiência e a transparência nos processos de contratação pública. É importante encontrar um ponto de equilíbrio que leve em conta tanto os interesses das empresas locais quanto a necessidade de garantir uma concorrência justa e aberta.